04/01/10

1. História e Geografia do Mercosul

O Mercosul é um “instrumento para promoção do comércio no interior da aliança” (Abreu, 1997:152) formada no seio da América do Sul, originando um bloco económico constituído pelos seguintes países: Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai e a Venezuela [nota 4]. (Vaz, 2002). Como parceiros com o estatuto de países associados são: a Bolívia, o Chile, a Colômbia, Equador e Peru. A figura 1 representa a América do Sul, onde podemos observar os países que formam o Mercosul e os países que são associados [nota 5]. (Piera, 1992:online).

De acordo com Vamireh CHACON, (2002:29), a superioridade territorial, populacional, económica, produtiva e industrial, concede ao Brasil uma “vocação de global trader” no seio do Mercosul: “ibero-americana nas fronteiras terrestres platina e amazónica, e oceânica universal pelo Atlântico”. De facto, do ponto de vista geográfico, o Mercosul não condiciona os seus Estados-membros à América do Sul, nem ao Cone Sul [nota 6]; condiciona sim, a um Mercado Comum do Sul. Por outro lado, possibilita uma maior aproximação, ou até integração, no comércio Africano, nomeadamente pelo Brasil, comercializando com países da Africa Austral e Sul (Angola e Moçambique), aproveitando estrategicamente uma articulação com os Países da CPLP (Comunidade de Países de Língua Portuguesa), proveniente de afinidades histórico-culturais. (Chacon, 2002).

Ainda que referido muito resumidamente, o Mercosul do ponto de vista histórico, tem alicerces na “assinatura do Tratado de Assunção”, em 26 de Março de 1991, pela República da Argentina, pela República do Paraguai, pela República Oriental do Uruguai, e pela República Federativa do Brasil, visando criar um Mercado Comum entre os países da América do Sul (Mercosul), abrindo o comércio e eliminando as barreiras alfandegárias, e um acordo político no âmbito das políticas macroeconómicas, a coordenar e a implementar de forma progressiva à medida que se desagravariam as tarifas, até à implantação da Tarifa Externa Comum (TEC) para incentivar a competitividade dos estados partes e promover internamente economias de escala eficientes [nota 7]. (Chacon, 2002:29).

Em 17 de Dezembro de 1991, através do Protocolo de Brasília [nota 8], fixou-se o sistema de solução e controvérsias no âmbito do Mercosul, dotado com três mecanismos extrajudiciais que visam solucionar conflitos: a negociação, a conciliação e a arbitragem. (Calvancante, 2006).

Segundo Almeida (2003:online), este mecanismo para resolver conflitos está longe de estar completo, mas os estados pertencentes ao Mercosul estão a trabalhar para que se aproxime do modelo europeu. Segundo a autora, “desde a constituição do Mercosul, o mecanismo de solução de controvérsias e o seu funcionamento passaram por quatro fases distintas: a) o anexo III do Tratado de Assunção; b) o Protocolo de Brasília; c) o Protocolo de Ouro Preto; e d) o Protocolo de Olivos”. Posteriormente trabalharemos este temas ao longo dos pontos que constituem este trabalho.

Este mecanismo estabilizador temporiza a resolução de conflitos para evitar a sua perpetuação, e têm de forma ascendente a seguinte hierarquia: privilegia a negociação directa dos Estados em conflito não podendo exceder quinze dias, submissão para apreciação ao grupo de Mercado Comum, que dispõe de trinta dias para se pronunciar, e numa situação hipotética, em que nenhuma das anteriores instâncias se revele capaz de resolver as discórdias, o processo transita para o âmbito do Processo Arbitral (a pedido dos Estados queixosos), acabando o processo num Tribunal Ad hoc, julgado por três árbitros, cuja sentença arbitral não pode ser alvo de recurso, ou seja, efectiva-se de imediato. (Baptista, 1998 [1994]).

Em 1994 foi aprovado e anexado um protocolo adicional, denominado Protocolo de Ouro Preto, na Cidade de Ouro Preto, que estabeleceu a estrutura institucional e proveu de personalidade jurídica internacional o Mercosul, concluindo-se assim o período de transição (Barbeiro e Chaloult, 2003). Com este episódio iniciou-se uma nova fase para o Mercosul, criaram-se os instrumentos fundamentais da política comercial comum, para atingir “um mercado único que gerasse maior crescimento econômico para os Estados Partes, por meio do aproveitamento da especialização produtiva, das economias de escala, da complementação comercial e do maior poder negociador do bloco com outros blocos ou países.” (Piera, 1992:online). Esta nova forma jurídica permitia ainda o estabelecimento de acordos entre o Mercosul e outros países ou blocos económicos, como veio a acontecer em 1995 “com o Acordo-Quadro de cooperação inter-regional com a União Europeia.” (Barbeiro e Chaloult, 2003:50).

Em San Luís, em 25 de Junho de 1996, na décima reunião do Conselho do Mercado Comum, foi assinada a “Declaração Presidencial sobre Compromisso Democrático no Mercosul”, bem como o Protocolo de Adesão da Bolívia e do Chile a essa Declaração (Barbeiro e Chaloult, 2003:50-51), “instrumento que traduz a plena vigência das instituições democráticas, condição indispensável para a existência e o desenvolvimento do MERCOSUL.” (Piera, 1992:online).

Segundo Barbeiro e Chaloult (2003:50), esta foi uma data importante porque definiu o compromisso entre todos os Estados-membros de se ouvirem, e em caso de ameaça ou de ruptura da ordem democrática num Estado-membro, determinarem e aplicarem “medidas punitivas” de forma a repor a ordem e a harmonia civil.
Em 1998 este princípio foi reforçado através do “Protocolo de Ushuaia sobre Compromisso Democrático” assinado novamente pelos assinantes do Mecanismo de Consulta e Concentração Política, onde era reconhecido a necessidade imperiosa do bom funcionamento das instituições democráticas, como condição indispensável para o processo de integração, capaz de determinar o sucesso do processo de integração regional. (Piera, 1992:online; Carneiro, 2007:812).

Com a Decisão CMC [nota 9] n.º 28/04 são definidas regras de negociação de acordos comerciais entre estados associados. Neste contexto aborda-se a problemática da adesão de novos Estados-membros. (Carneiro, 2007).

Com a decisão CMC número 25 de 2005 passam a estar reguladas as condições para a integração no grupo de um qualquer novo Estado [nota 10], e a 4 de Julho de 2006, por solicitação da Republica Bolivariana da Venezuela [nota 11], foi deferido o Protocolo de Adesão desta ao Mercosul, ficando estabelecidas as condições e prazos para a definitiva agregação da Venezuela ao bloco. (Piera, 1992:online).
Concluindo esta abordagem histórico-geográfica pode afirmar-se citando o professor doutor Amado Luiz Cervo [nota 12], que “é o mais bem concebido de todos os mecanismos de integração, alavancou a ideia de América do Sul, região de convergência politica e de integração económica em substituição à América Latina, desde que o México orientou-se para o norte.” (Cervo, 2001:11).


NOTAS:

[4] Recentemente, em 04 de Julho de 2006, foi aprovado o Protocolo de Adesão da República Boliviana da Venezuela ao Mercosul. Porém, para entrar em vigor o protocolo este tem que ser ratificado pelos cinco países: pelos quatro países membros e pela Venezuela (como interessada em integrar o grupo). Até ao momento essa adesão foi aprovada pelos Parlamentos de Venezuela, Argentina e do Uruguai, e carece de aprovação dos Parlamentos do Brasil e Paraguai, momento em que formalmente se conclui o processo de adesão. Não obstante, a Venezuela está presente nas reuniões do Mercosul e tem uma palavra a dizer sobre todos os assuntos com os países membros. Por isso é considerada um Estado-membro e não um Estado-associado. (Piera, 1992:online).

[5] O Chile é um país associado do Mercosul apesar de estar representado com uma cor diferente dos restantes países associados. Optou-se por manter o mapa, ainda que incorrecto neste momento, fazendo uma ressalva para afastar a ideia de negligência.

[6] Devido às afinidades geográficas, económicas, naturais, sociais e até culturais, normalmente designa-se por Cone Sul a área geográfica que abrange o Chile, a Argentina, o Uruguai, e os estados brasileiros do Sul (Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e São Paulo), ou seja, a parte Meridional da América do Sul. Por uma questão de continuidade geográfica, estende-se a definição de Cone Sul ao Paraguai e ao Sul da Bolívia, sendo que existe uma descontinuidade evidente em relação aos elementos característicos enumerados anteriormente. Este espaço geográfico, tem fisicamente formato de cone, e tem como vértice o Cabo Horn; o ponto mais meridional das Américas, banhado pelos Oceanos: Atlântico e Pacifico.

[7] Segundo o Dr. Luís PIERA (1992:online), coordenador da informação existente na página oficial do Mercosul na Internet, o Mecanismo de Consulta e Concentração Politica, construído pelos quatro estados fundadores (Argentina, Brasil, Paraguai, Uruguai) em conjunto com a Bolívia e o Chile, é o exemplo mais evidente do interesse do acordo político entre estas Nações, de forma a uniformizar com consenso posições políticas de âmbito regional, que não somente comercial e económico.

[8] Consultado na página oficial do Sistema de Informação do Comercio Exterior (SICE), disponível em http://www.sice.org/trade/mrcsr/brasilia/pbrasilia_p.asp, acedido em 08JAN10.

[9] CMC: Conselho de Mercado Comum. Órgão administrativo do Mercosul.

[10] Esta regulação não alterou em nada os objectivos definidos inicialmente no Tratado de Assunção.

[11] Segundo Carneiro (2007:812), isto verifica-se no Art.º n.º 1 da MERCOSUL/MCM/DEC. N.º 29/05.

[12] Historiador brasileiro, autor de um vasto conjunto de obras, trabalhou com destaque a politica externa brasileira, está ao nível de historiadores como “Pierre Renouvin, Jean-Baptiste Duroselle e René Girault” e destaca-se pelas qualidades pessoais e profissionais. (Martins, 2003:16).

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