27/11/08

Período entre Afonso II e Afonso III

No reinado de Sancho II (rei legitimo até 1245) assistiu-se a uma prioridade da expansão militar. Com grande coragem e valentia, o rei e a ordem militar de Santiago conquistaram todo o Alentejo e parte do Algarve. Todavia, estes feitos foram conseguidos em detrimento da centralização administrativa e da manutenção da justiça e equidade no reino, que deu origem a abusos de poder por parte da nobreza e de outras classes privilegiadas em relação ao povo, e também, a membros do clero (Fernandes, 2004; Letra, 2003; Saraiva, (1993 [1978]).

Face a esta conjuntura, a imagem do monarca que deveria representar a estabilidade, paz e justiça transformou-se num sentimento generalizado de descrédito com maior amplitude no clero e no povo. As reiteradas denúncias de transgressões da nobreza para com os membros do clero (ameaças, diminuição de poderes e bens), levaram a uma primeira bula papal (Inter alia Desiderabilia) emitida pelo papa Inocêncio IV, em Março de 1245, que exigia a Sancho II uma posição para conter a crescente agitação e desordem.

Todavia, esta falha durante o reinado de Sancho II tem várias justificações. Se nos posicionarmos no reinado de Afonso II verificamos que ele foi muito rígido, criou as primeiras leis que visavam a protecção dos bens da coroa, a garantia da liberdade individual e a proibição de abusos por parte dos funcionários régios, ou seja, deu os primeiros passos na protecção das classes populares contra as prepotências dos poderosos (Saraiva, 1993:84 [1978]).

Quando morreu D. Afonso II, o seu filho Sancho II era ainda muito novo, e os barões apoderam-se da situação para se libertarem da estrutura governamental começada por Afonso II[1]; transformaram o reino numa anarquia política, de que é exemplo a inexistência de legislação escrita, falta de registos na chancelaria régia, cessação da exigência das confirmações e das inquirições, e também, frequentes guerras privadas.

Segundo Fernandes (1993 [1978]), esta moldura negra no reinado de Sancho II também era influenciada pelos segundos filhos da nobreza, devido à adopção de um novo sistema de sucessão linguístico[2]. Para a autora, os segundos filhos da nobreza que se sentiam penalizados insurgiam-se, originando uma elevada agitação política e social, para adquirir através da extorsão os bens e direitos que lhes são negados por herança.

Apesar da bula papal, as exigências do papa não foram atendidas, a opressão continuou, e no Concílio de Lyon em Julho de 1245, o mesmo papa, através de uma segunda bula (Grandi Nom Immerito), e sob a acusação de Rex Inutilis, destitui Sancho II e atribui ao seu irmão Infante Afonso, Conde de Bolonha a administração do reino, tendo sido coroado (rei Afonso III) em 1248 após a morte do seu irmão em Toledo, onde se tinha refugiado.

As negociações para que o Conde de Bolonha, então casado com D. Matilde de Bolonha e a viver em França, assumisse o trono de Portugal foram levadas a cabo por bispos e alguns nobres descontentes com o governo de Sancho II.

O conde de Bolonha aceitou a proposta e assinou em paris um documento intitulado de Juramento de Paris, onde se comprometia “…não só a respeitar as imunidades da Igreja, mas a guardar a todas as comunidades e concelhos, cavaleiros e povos os bons costumes e foros escritos e não escritos que vinham do tempo de seu avô e bisavô.”. O documento foi assinado na presença do Arcebispo de Braga e representante do bispo de Coimbra, enviados para o efeito e levando consigo o selo próprio que permitisse a validação do ponto de vista lei.

Afonso III teve sempre muito apoio por parte das massas populares (motivo pelo qual desembarcou em Lisboa, em 1245, sem qualquer exercito), do clero e de alguma nobreza, ainda que reduzida. Após muita resistência de Sancho II, onde se inclui a guerra civil entre os adeptos de ambas as partes, dois anos depois Sancho II foge para Toledo onde viria a morrer um ano depois.

A conjuntura que se verificava na data em que Afonso III subiu ao trono (1248), é por si só uma importante justificação da atitude do monarca, apostando na criação de instituições, com órgãos de Justiça competentes, com princípios e formas de execução Jurídica, iniciando um processo de sistematização das normas de funcionamento do aparelho burocrático-administrativo, dando assim continuidade ao trabalho iniciado com o seu pai, Afonso II.

Os investigadores indicam ser no reinado de Afonso II que surgem os primeiros indícios da criação de leis que visam assegurar a justiça, ou seja, a burocratização administrativa que se assiste no governo de Afonso III. Porém, de acordo com o tipo de leis criadas e a sua importância, entre os autores existem divergências.

Se para Letra (2003:84) “os historiadores relacionam as Cortes de Coimbra[3] de 1211 com a publicação de um importante conjunto de leis que constitui a mais antiga legislação portuguesa” para Fernandes (2004:76) “os especialistas em História de Direito são unânimes em considerar o reinado de Afonso III como o de início do período de recepção do Direito comum e, portanto, do Direito Romano Justinianeu de Portugal”.

No entanto, se existem algumas dúvidas em relação à data especifica que se pode considerar a introdução do Direito Romano, através de leis para regular a acção das pessoas, os seus bens e tributos fiscais, não existe nenhuma dúvida em relação à dificuldade que foi para a população interiorizar o novo sistema e adaptar-se a ele.

Em áreas interiores, onde todos os assuntos eram resolvidos de forma oral, através da palavra de homem para homem, quando os funcionários régios introduzem a escrita muitos dos bens existentes são retirados à população para o rei porque estes não tem como provar, de forma escrita, que são seus.

O rei para tornar a justiça mais íntegra criou os denominados “oficiais do rei”; juízes que residiam próximo do rei. Os “oficiais do rei” distinguiam-se dos restantes funcionários régios porque não tinham qualquer contacto ou relação de parentesco com as pessoas que iriam sentenciar em tribunal. Esta medida visava tornar os julgamentos e outras acções de justiça menos tendenciosos e mais equilibradas.

A mão pesada de Afonso III vai fazer reduzir o poder senhorial, ainda que a tarefa nunca se diga ser fácil, através da cessação da monarquia feudal para passar para um regime de poder monárquico central, onde o rei é o representante máximo da justiça, e terá que passar por ele todas as decisões do reino. O rei é considerado justo, as pessoas que lá vivem consideram-se seguras por não viverem num clima de instabilidade e opressão, de acordo com de Letra (1993:87).

“Em 1258 foram ordenadas inquirições gerais cujos resultados serviam de base a uma vasta obra de reorganização administrativa. Os abusos dos nobres sobre os vilãos foram reprimidos, as garantias municipais robustecidas. Diz a crónica de 1419: «…manteve [o rei] a sua fazenda em grande regra, e o reino em muita justiça e assossego. E corregeu a terra, que estava muito estragada do tempo do seu irmão, el-rei D. Sancho Capelo.»”.

Todas as acções de Afonso III vieram a revelar-se positivas no reinado do seu filho, D. Dinis, devido ao aperfeiçoamento da máquina administrativa do Estado, e também, ao desenvolvimento das actividades económicas.


Referências Bibliográficas:


FERNANDES, Fátima (2004), A recepção do Direito Romano no Ocidente Europeu Medieval: Portugal, um caso de afirmação régia, Revista de História: Questões & Debates, Curitiba, Editora UFPR, Brasil, pág. 73-83.

LETRA, Carlos (2003), História Cronológica do meu Portugal, Edições Gailivro Lda, Lisboa.

SARAIVA, José Hermano (1993 [1978]), História Concisa de Portugal, Publicações Europa-América, 16ª Ed., Lisboa, pág. 73-94.

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[1] D. Afonso II através da criação de um conjunto de leis regulou a propriedade privada, o direito civil e a cunhagem de moeda.

[2] Em Portugal desde o século XI verifica-se um crescimento demográfico e uma melhoria geral das condições climáticas e das técnicas de produção agrícola. Como a propriedade da nobreza estava concentrada no Norte, as famílias nobres estavam a crescer cada vez mais e a dispor de uma menor concentração de territórios sobre o seu controlo directo porque utilizavam o sistema de sucessão cognática que consiste na partilha de herança entre todos os filhos. No decorrer do séc. XIV no sentido de solucionar esta situação, os nobres passam a adoptar um sistema de sucessão linguístico, que privilegia o varão mais velho em detrimento dos segundos filhos.

[3] Foram as primeiras cortes realizadas que dispõem de informação escrita que chegou aos nossos dias (Saraiva, 1993: 84).

25/11/08

Relações entre a nobreza e a realeza no reinado de D. Dinis

Contextualização temporal: D. Dinis nasceu em Lisboa (09-10-1261) e faleceu em Santarém (01-01-1325), filho de D. Afonso III e de D. Beatriz de Castela, subiu ao Trono por morte de seu pai em 16-02-1279. Faleceu com 64 anos, dos quais reinou 46.

Ao analisar a duração dos reinados da primeira dinastia poderemos depreender, pelos menos aparentemente, que estes se caracterizam por uma grande estabilidade. No entanto, a primeira dinastia foi alvo de vários conflitos, opondo o poder régio, ora ao clero, ora aos senhores feudais, existindo ainda alguns conflitos no interior da própria realeza. O reinado de D. Dinis, que durou 46 anos, foi o mais extenso e um dos mais conflituosos dos reinados da primeira dinastia.

Quando subiu ao trono D. Dinis herdou do seu pai um grave conflito com o alto clero e com a Santa Sé, em virtude do qual foi lançado sobre Portugal um interdito geral. Apesar da pesada herança D. Dinis mostrou-se à altura das necessidades e imprimiu durante o seu reinado paz, prosperidade e equidade social, e implementou medidas de protecção das fronteiras, de defesa da ideia de Nação (adopção do português para a Chancelaria Régia) e fez aplicar a justiça.

Todavia, apesar de tanto ter lutado pelo progresso e desenvolvimento do País, D. Dinis não pode evitar três grandes conflitos: a guerra com Castela, que desistiu depois de obter as vilas de Moura e Serpa, a guerra com o reino mouro de Granada, como forma de prolongamento das lutas pela reconquista para a afirmação do poder real português, e a guerra civil, primeiro com o seu irmão D. Afonso, depois com o seu filho e herdeiro, também chamado Infante D. Afonso. É sobre esta última, a guerra civil, que vai incidir a minha resposta em virtude de ser o conflito mais marcante entre a nobreza e a realeza (Serrão, 1978).

D. Dinis durante todo o seu reinado nunca escondeu o seu voraz apetite pelas delícias do género feminino. Esta postura galante originou várias amantes, e consequentemente vários filhos bastardos. De todos os filhos bastardos três estavam muitos próximos do monarca: Afonso Sanches, João Afonso e Fernão Sanches, e constituíam uma ameaça real ao Infante D. Afonso, pretendente ao trono.

O Infante D. Afonso ao sentir-se ameaçado ostenta posturas de desagrado e desobediência (situação que dura cerca de 5 anos) e declara guerra ao seu pai em 1320. Conta com o apoio de sua mãe, rainha D. Isabel, “…pouco afecta ao marido, até devido à inconsistência conjugal deste e às numerosas amantes e filhos derivados… ” (Marques, 1987:491), e também, “…com o apoio da maioria dos grandes senhores do Norte e do Centro do País…” (Marques, 1987:491).

D. Dinis tem pelo seu partido os três filhos bastardos, “…os burocratas da Corte, alguns nobres de segunda plana e linhagem duvidosa, boa parte dos grandes concelhos do Sul, os mestres das ordens militares e uma fracção dos bispos…” (Marques, 1987:491).

Em prol da avançada idade do Rei e da possível subida ao trono do Infante, num futuro próximo, uma grande parte da Nobreza e do Clero ficou numa posição de neutralidade. Todavia, em torno desta guerra civil estava a generalidade da nobreza feudal e a totalidade do poder régio. É de facto a presença maciça destes elementos que vai equilibrar os dois partidos, tornando a guerra mais demorada e sem grandes vitórias.

Ambas as fracções tinham motivos diferentes para fazer a guerra: o Infante D. Afonso baseava-se em argumentos económicos (ambição e necessidades financeiras para fazer valer a sua condição social) e pessoais (ciúme, inveja, e até receio da perda do trono, em particular para Afonso Sanches), enquanto D. Dinis procurava insinuar que combatia o exército do Infante porque estava repleto de criminosos de delito comum.

É evidente que todo o suporte desta guerra está na Nobreza Feudal cansada de perder privilégios e de se submeter às ordens de D. Dinis. A política do monarca tinha como objectivo o reforço do poder real através da centralização, e todas as medidas implementadas eram em detrimento da Nobreza, não para acabar com os senhores, mas para controlar os seus poderes fazendo prevalecer os poderes da coroa independentemente do Nobre. Exemplo disso foi o conflito de 1281, em que o seu irmão D. Afonso criou um domínio senhorial muito grande na zona de Marvão, encarado por D. Dinis como perigo que se mostrava aquele potentado laico; entram em conflito aramado, resolvido com Escambo (trocas), para desarticular os territórios do infante e deixar de ter aquele potentado na fronteira.

Entre 1320 e 1325 D. Dinis executou uma serie de medidas contra a nobreza feudal: várias inquirições: 1321, 1322 e 1324, proibição de se constituírem novas honras (1321), lei contra os abusos da jurisdição feudal (1324), proibição ao Clero de interferir nos testamentos (1323), protecção ao clero minhoto contra abusos da Nobreza, etc. É com base nesta conjuntura que “…a nobreza feudal, ameaçada nos seus privilégios [e] centralismo régio (…) cansados de protestar e de se submeter os senhores feudais viam nas ambições do herdeiro da Coroa um meio excelente de obterem a revanche por que esperavam havido tanto tempo.” (Marques, 1987:492). O apoio ao Infante feito pela Nobreza Feudal é decisivo para o desenrolar do conflito armado porque permite o equilíbrio entre as duas forças.

Apesar de existirem interesses da Nobreza Feudal igualmente existiam interesses camuflados de Castela e Aragão, que sempre tentaram fomentar conflitos visando criar divisões internas para enfraquecer a monarquia portuguesa face aos restantes reinos peninsulares; o que é visível no facto Castela se colocar ao lado dos dois partidos ao mesmo tempo, e na citação de Marques (1987:492): “ (…) havia (…) interesses disfarçados de Castela e de Aragão, sempre conducentes a fomentar divisões internas na monarquia portuguesa (…)”.

Após vários encontros, em que numa primeira fase (1322) por actuação do papa existe um acordo, depois numa segunda fase (1323), que por actuação da própria Rainha D. Isabel em conjunto com o Bispo da Cidade de Lisboa, D. Gonçalo Gonçalves de Pereira, alcançaram-se novas tréguas, surge a terceira e última fase (1324), data em que o Infante D. Afonso conseguiu a destituição de Afonso Sanches e o seu afastamento da Corte, o que acontece pouco tempo antes de morrer D. Dinis. Contudo, se D. Dinis não tivesse morrido, a guerra ter-se-ia reacendido.

Apesar de todos estes confrontos os conflitos da realeza e da nobreza continuaram, mesmo no reinado de D. Afonso IV (este contra os seus irmãos bastardos).

D. Dinis morre e o sobe ao poder D. Afonso IV (1325). Este cheio de vingança e ressentimentos apressa-se em condenar e mandar executar os dois meios-irmãos filhos de D. Dinis. Porém, só consegue executar o infante João Afonso porque Afonso Sanches refugiou-se em Albuquerque, Espanha, e morre em 1328.

Em traços gerais, D. Afonso IV inicialmente foi ao encontro das pretensões da Nobreza, que reclamavam o seu pagamento pela ajuda prestada, mas após o reino estar sólido redefiniu a sua politica e retomou a centralização do poder na coroa.


BIBLIOGRAFIA

SERRÃO, Joaquim Veríssimo, História de Portugal (1978), Volume I: Estado, Pátria e Nação (1080-1415), 2.ª ed., Editora Verbo, Lisboa.

MARQUES, A. H. Oliveira (1987), Portugal na Crise dos Séculos XIV e XV, Editora Presença, Lisboa.


14/11/08

Povoamento nos Reinos de Portugal e do Algarve no Portugal Medieval

Tendo como fontes de informação o rol de tabeliães (1290) e o rol de igrejas (1320/1321) verifica-se uma constante em ambos: Portugal Medieval registou no Norte um maior índice de povoamento em relação ao Sul com uma zona de transição no centro definida pela “Linha do Tejo”.

A partir de vários documentos (Registos paroquiais, Registos das Igrejas e Contos relacionados com sistemas fiscais) poderemos inferir, ainda que com margem de erro, a distribuição populacional de Portugal medieval.

“Em termos de organização paroquial, podemos verificar que nele se patenteia a mesma oposição entre o Norte e o Sul do país – com uma zona de transição no Centro – que José Mattoso pôs em evidência na sua obra mais célebre, definindo-os como um Norte (Atlântico) senhorial e rural e um Sul (Mediterrânico) concelhio e urbano.
De facto, o Norte, de povoamento denso e disperso, estava retalhado numa infinidade de pequenas freguesias enquanto que no Sul, onde havia menos homens mas mais concentrados, as paróquias eram menos numerosas e consequentemente mais extensas…”
(Rodrigues, S/d:71)


De acordo com a anterior citação de Rodrigues (serviu-se do trabalho de A. H. de Oliveira Marques como alicerce do seu estudo) são bem visíveis as dicotomias existentes no Portugal Medieval ao nível da população.

A existência de muitas igrejas no Norte aponta para a existência de muitos fiéis em número mas dispersos geograficamente, enquanto que no Sul predominavam núcleos populacionais de grande dimensão e muito concentrados, em relação ao norte. A igreja contribui para o reino de acordo com o n.º de fiéis que possui.

Em relação aos tabeliães (notários) a sua distribuição é semelhante à disposição das Igrejas. Locais de elevada concentração populacional vão exigir mais tabeliães em dimensões semelhantes às igrejas e vice-versa.

A Reconquista Cristã iniciou-se no Norte da Península e conheceu a direcção Norte-Sul. Portugal formou-se e alargou-se graças a este movimento militar, no qual participaram todas as classes sociais. Nos primeiros tempos os reis cristãos tiveram como apoio importantíssimo a nobreza terratenente, poderosíssima com os seus exércitos privados. Esta nobreza vivia e possuía os seus bens no Norte da Península Ibérica.

Foi pois natural que essa mesma nobreza fosse recompensada pelos serviços militares prestados na luta contra o infiel muçulmano; as recompensas à nobreza eram, sobretudo, feitas através das honras, que eram terras apropriadas pela nobreza sem concessão régia.

Mas também a igreja recebia doações, quer como recompensas reais, quer por testamento como forma de salvação das almas: eram formadas por uma doação com carta de couto.

Honras e coutos, foram pois senhorios administradas pelos senhores (nobres e eclesiásticos) que se transformaram em fonte de rendimento para os seus proprietários. Nestas vastas propriedades viviam famílias de camponeses que se tornaram na mão-de-obra necessária e que se foram estabelecendo em aglomerados populacionais dentro do próprio senhorio dando origem às vilas e aldeias.

A toponímia de algumas destas povoações revela a genealogia dos grandes senhores terratenentes da região norte do país.

Mas, ainda, fazendo uma observação mais atenta, verifica-se que mesmo no norte registou-se diferenças na distribuição das populações. Enquanto que o interior se manteve durante toda a Idade Média rural, já no litoral norte as populações se dedicavam também à pesca como forma de complementar a actividade agrícola: surgiram assim as póvoas.

Os rios e o oceano sempre foram atracções para as pessoas que os elegiam não só para a prática da pesca, mas como vias de comunicação e transporte excelentes (não se pode esquecer que no Portugal Medieval as vias terrestres eram más e perigosas). É natural que desde muito cedo as pessoas os tivessem escolhido para junto deles se estabelecerem.

Outras actividades se desenvolveram: artesanato e comércio marítimo, que estiveram na origem do surgimento de uma nova classe social: a burguesia, instalada em novos aglomerados populacionais: os burgos onde desenvolvia cada vez mais a sua actividade, tornando-se cada vez mais rica. Ainda que a designação de “Cidade” só possa ser adoptada depois de uma área geográfica possuir uma sede de bispado, foi devido aos burgos que surgiram núcleos comerciais muito importantes, que de alguma maneira estão ligados ao surgimento de novas cidades.

As principais cidades no século XII eram Lisboa, Porto, Coimbra e Santarém, todas estas fundadas junto de rios e próximas do mar.

No que respeita ao sul, foi sempre menos populoso. Este facto deve-se aos avanços e recuos da Reconquista Cristã. Durante muitos anos, Évora foi o único reduto cristão ao Sul da “Linha do Tejo”.

Foram grandes os esforços muçulmanos para manter o território a Sul do Tejo e tentar recuperar a linha defensiva do rio, sobretudo durante os períodos de domínio dos Almorávidas e dos Almóadas.

A Reconquista Cristã fez-se sobretudo graças ao contributo das Ordens Religiosas Militares, que à semelhança do que havia acontecido com a nobreza terratenente também receberam doações por parte do rei.

Era difícil fazer a exploração económica da região sul, dado os constantes ataques por parte dos muçulmanos. As terras recém-conquistadas ficavam muitas vezes desertas, sem populações para as defender e fazer o seu aproveitamento económico.

Para atrair as pessoas, o rei e os monges guerreiros concederam cartas de foral e os concelhos surgiram a pouco e pouco.


RESUMO


Norte mais populoso

Interior – Senhorios agrícolas com vilas e aldeias construídas por camponeses (servos da gleba e vilões) dependentes da terra e da vontade dos proprietários.

Litoral – Senhorios agrícolas e póvoas. Surgem devido à prática e desenvolvimento do comércio nas cidades.

Sul menos populoso

Permanência longa dos muçulmanos nesta região da península, e também menos cursos de água facilitadores da deslocação de pessoas e bens.


Bibliografia de Referência:


RODRIGUES, Ana (S/d), A formação da rede paroquial no Portugal Medievo, Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.