09/05/09

Trade Off: Sustentabilidade Versus Modernidade

Se procedermos a uma retrospectiva histórica é fácil perceber que mesmo antes dos descobrimentos e da revolução industrial o ser humano já lesava a natureza trazendo para si modificações climáticas locais. A evolução tecnológica que procedeu à Revolução Industrial somente serviu para a dilatar, fortificar e acelerar a degradação da natureza, dizendo ser para o desenvolvimento da humanidade.

Em 1987, a Comissão Mundial para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, presidida por Gro Harlem Brundtland[1], elaborou um documento denominado Nosso Futuro Comum também conhecido como Relatório Brundtland, onde os governos subscritores se comprometiam a promover o desenvolvimento económico e social em harmonia com a preservação ambiental (W.C.E.D., 1991). Entre outras coisas, o relatório Brundtland serviu para definir o próprio conceito de Desenvolvimento Sustentável[2], distanciando-o do conceito de Crescimento Económico, que até então representava a “única verdade”.

No decorrer do século XX, surgiram de forma isolada por todo o mundo vozes de apoio a esta fracção ambientalista emergente. Exemplo disso foi Celso Furtado[3], um dos economistas brasileiros com maior destaque intelectual, ao afirmar que “ (…) só haverá verdadeiro desenvolvimento, que não se deve confundir com crescimento econômico, no mais das vezes resultado de mera modernização das elites – ali onde existir um projeto social subjacente” (Veiga, 2005).

Apesar de existir interesse por parte de alguns chefes de estado em adoptar medidas sustentáveis, só em 1992 na conferência do Rio com a participação de 175 chefes de estado e de Governo se desenharam as bases para a criação de uma associação mundial entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, assim como entre os governos e os sectores da sociedade civil, com maior ênfase na compreensão das necessidades e os interesses comuns. Nesta conferência foi acordado a construção da agenda 21 (Bezerra e Bursztyn, 2000) e elaborada a Declaração do Rio sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (W.C.E.D., 1991).

Apesar dos progressos sem precedentes em matéria de consciencialização ambiental, em grande parte facilitados pela Conferência do Rio, foi preciso quase uma década após a instituição da Comissão Mundial para o Ambiente e Desenvolvimento (1983) para a concretização desta conferência; o que é elucidativo do parco interesse por questões ecológicas neste período (Camargo, 2004).

Actualmente, muito se fala em desenvolvimento sustentável; conceito que surgiu em meados de 1970 a partir dos estudos da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre as mudanças climáticas, e procura conciliar a necessidade de desenvolvimento económico da sociedade com a promoção do desenvolvimento social e com o respeito pelo meio-ambiente. Convém referir, não só pelo factor pioneiro mas também pelo mérito científico, que foi com o Clube de Roma[4], na década de setenta, que pela primeira vez se questionou a destruição do meio-ambiente, contrariando assim as aspirações capitalistas (Camargo, 2002).

Apesar de toda a discrepância temporal, entre o inicio das organizações/conceitos de teor ambiental e o início da interiorização destes conceitos pelas das massas populacionais (de que é exemplo o próprio conceito de Desenvolvimento Sustentável que já é trabalhado desde a década de 70 do séc. XX), presencia-se actualmente o desejo de evoluir para um novo desenvolvimento com princípios sustentáveis, que compatibilize as dimensões económica, social e ambiental em detrimento do antigo trade off: crescimento económico e redução da pobreza por um lado, e preservação ambiental por outro lado (Castro, 1996).

As questões em análise são evidenciadas em diversa literatura, possibilitando uma maior difusão e mobilizando cada vez mais meios humanos para esta causa. Apesar de ser evidente o consenso humano para este problema, evidencia-se uma superioridade do lado económico em relação ao ambiental.

Se tomarmos como exemplo os recursos hídricos e tivermos em consideração que o art.º 9 do DQA (Directiva Quadro da Água) remete os custos ambientais e de recursos para o princípio do poluídor-pagador, deixando claro que a única forma de assegurar uma utilização sustentável da água é inflacionar o seu preço, de forma a permitir recuperar os custos de produção, quantos cidadãos aceitaram pacificamente, sem protestos generalistas, a subida do preço da água? Será que com a inclusão de uma taxa que visa reduzir a escassez de recursos hídricos se vão consciencializar e aceitar a redução do seu consumo actual? Mobilizar-se para esta finalidade? Diminuir o padrão de exigência a que estão habituados? Compreende-se que a questão é complicada, que os ciclos económicos são frágeis, instáveis e têm influência nestas situações, mas “ (…) contabilizar a extracção, uso e renovação natural nas fontes de recursos naturais…” (Dias, S/d:13) é algo correcto que peca por ser tardio.

Para terminar esta incursão, que pretende avaliar até que ponto a “sustentabilidade é amiga da modernidade”, nada melhor que referir o livro de Veiga (2005), que em quatro capítulos densos e eruditos (na minha perspectiva fruto de leituras bem escolhidas e de reflexão original), o autor discute os conceitos de desenvolvimento e de sustentabilidade e as diferentes formas de abordagem com algum detalhe. A obra é muito abrangente, o que consentiria que me alongasse nesta reflexão. Porém, por limitação de páginas, somente farei um resumo que solidifica todo o que foi escrito neste ponto.
Concordo com o autor de que necessitamos de novos modelos, já que estamos sentados sobre as ruínas do socialismo real, do Consenso de Washington, do crescimento económico socialmente perverso por se alimentar de desigualdades crescentes, da social-democracia, que foi longe demais na aceitação da economia de mercado, um conceito que Galbraith (2004) considera com razão como totalmente inócuo e por isso tão difundido, e em paralelo, devemos superar as barreiras que hoje separam as diferentes disciplinas do saber, caminhando para a eco-socio-economia proposta pelo economista alemão Karl William Kapp (Luzzati, 2004).

William Kapp[5], que “combateu” degradação ambiental no decorrer do século XX, nunca desconsiderou os países menos desenvolvidos, e tentou sempre neutralizar a ideia que a conservação da natureza só pode ser plenamente alcançada em economias prósperas (Luzzati, 2004). Conclui, como era de esperar, pela defesa do conceito de desenvolvimento sustentável como utopia para o século XXI, postulando a necessidade de buscar um novo paradigma científico, capaz de se substituir ao industrialismo.

BIBLIOGRAFIA

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BEZERRA, Maria et al (coord.) (2000), Ciência & Tecnologia para o Desenvolvimento Sustentável, Edição do Ministério do Meio Ambiente do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, Brasília.

BRAUCH, Hans et al (2003), Security and Environment in the Mediterranean: Conceptualising Security and Environmental Conflicts, 1ª Edição, Editora Springer, Berlin.

CABRAL, Maria (coord.) (2006), Livro Vermelho dos Vertebrados de Portugal, editado pelo ICN (Instituto da Conservação da Natureza), Lisboa.

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CAMARGO, Ana et al (2004), Meio ambiente Brasil: avanços e obstáculos pós-Rio-92, 2.ª Edição, Editora Estação Liberdade: Instituto Sociombiental, Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro/Brasil.

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CCE (comissão das comunidades europeias) (2006), Comunicação da comissão ao conselho e ao parlamento europeu: estabelecimento de uma estratégia de ambiente para o Mediterrâneo, Editado pela União Europeia/Agência Europeia do Ambiente, Bruxelas.

CRISTOVÃO, Fernando (2001), Método: sugestões para a elaboração de um ensaio ou tese, Edições Colibri, Lisboa.

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FURTADO, Celso (1974), O Mito do Desenvolvimento Económico, Editora Paz e Terra, Rio de Janeiro/Brasil.

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KUCHLING, Rolf, SCHMIDT, Pia (2000), O ambiente marinho e costeiro no Mediterrâneo – Estado e Pressões, Editado pela Agência Europaia do Ambiente/ Serviço das Publicações Oficiais das Comunidades Europeias, Luxemburgo, ISBN 92-9167-191-6.

RIBEIRO, Orlando (1963 [1945]), Portugal o Mediterrâneo e o Atlântico, 2ª Edição, Editora Livraria Sá da Costa, Lisboa.

RIBEIRO, Orlando (1987), Mediterrâneo: Ambiente e Tradição, 2ª Edição, Editora Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa.

SACCHETTI, António (2006), O Mediterrâneo, Geopolítica e Segurança Europeia, Editado pela Comissão Cultural da Marinha/Grupo de Estudo e Reflexão de Estratégia (GERE), Lisboa, ISBN 972-8004-83-4.

SOUTO, Henrique (2008), Manual de apoio da disciplina de Geografia do Oceano, Lisboa. Trata-se de um bloco de documentos elaborado pelo Sr. Doutor Henrique Souto e entregue aos alunos que frequentaram a disciplina de geografia do Oceano no ano lectivo 2007/08.

VASCONCELOS, Álvaro et al (coord.) (2002), A European strategic concept for the Mediterranean, Editado por Instituto de estudos Estratégicos e Internacionais, Lisboa.

VEIGA, José (2005), Desenvolvimento sustentável – desafio do século XXI, Editora Garamond, Rio de Janeiro, ISBN: 8576170515.

VIRGILI, Carlos (2004), Mediterrania: mar de vida, el litoral espanyol = mediterraneo. ma de vida, el litoral español = mediterranean. sea of life, the spanish coast, 1ª Edição, Editora Lunwerg Editores, S.A., Barcelona.

WATKINS, Kevin (dir.) (2007/08), Combater as alterações climáticas: Solidariedade humana num mundo dividido, Relatório de Desenvolvimento Humano, Ed. Almedina, Coimbra.

W.C.E.D. (World Comission on Environment and Development) (1987), Our Common Future, Editado pela W.C.E.D. – Versão traduzida: O Nosso Futuro Comum (1991), Editora Meribérica/Liber Editores, Lda., Lisboa, ISBN 51704/91.

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[1] Gro Harlem Brundtland é uma política, diplomata e médica norueguesa, e ainda, uma líder internacional em desenvolvimento sustentável e saúde pública. Em 1974 foi nomeada Ministra do Ambiente, e em 1981 tornou-se a primeira mulher chefe de governo do seu país, sendo actualmente Enviada Especial para as Alterações Climáticas da ONU.
Terminou em 1963 os estudos superiores na Escola Médica da
Universidade de Oslo e, em 1965 obteve o grau de Mestre em Saúde Pública na Universidade de Harvard. Entre 1983 e 1987 presidiu à Comissão Brundtland, da Organização das Nações Unidas, dedicada ao estudo do meio ambiente e a sua relação com o progresso.

[2] Conceito de Desenvolvimento Sustentável baseado na obra: o nosso futuro comum (1987) – satisfazer as necessidades do presente sem hipotecar o alimento das gerações futuras (W.C.E.D., 1991); o que ainda hoje se verifica.

[3] Celso Furtado foi um importante economista brasileiro e um dos mais destacados intelectuais do país ao longo do século XX. As ideias que defendia sobre o desenvolvimento/subdesenvolvimento divergiram das teorias económicas dominantes neste período, e estimularam levando mesmo à aceitação pelo governo de políticas intervencionistas no funcionamento da economia.

[4] O Clube de Roma constitui-se em 1968, formado por cientistas, industriais e políticos. Fez a diferença pela “carga intelectual” que lhe estava subjacente, e também pelos interesses em estudar o uso dos recursos naturais, e avaliar possíveis impactos em prol do excessivo crescimento da sua utilização. Ao referir o Clube de Roma tem obrigatoriamente de se referir o estudo The Limits of Growth, publicado no ano de 1972, elaborado por todos os investigadores do Clube de Roma e liderado por Dennis L. Meadows. Este estudo fazia uma projecção para cem anos tendo concluído que para atingir a estabilidade económica e respeitar a finitude dos recursos naturais era necessário diminuir o crescimento da população global e o capital industrial. Houve quem apoiasse o estudo, e houve quem não o fizesse. Certo é que este estudo, editado em várias línguas para que a sua difusão pelas massas populacionais tivesse maior impacto, trazia à “praça pública” as velhas teorias de Malthus.

[5] O trabalho do professor e investigador Karl William Kapp caracteriza-se pela coerência, permitindo construir estratégias para um desenvolvimento económico duradouro compatível com as aspirações individuais e com o ambiente físico e natural.


08/05/09

O Mar Mediterrâneo

O Mar Mediterrâneo é um mar intercontinental localizado entre a Europa Meridional, o Norte de África e o Sudoeste da Ásia (Fernandes, 2004). A Ocidente liga-se com o Oceano Atlântico pelo estreito de Gibraltar, onde atinge 300 metros de profundidade, e a Este comunica com o Oceano Índico pelo Canal do Suez. De acordo com o grande Geógrafo Orlando Ribeiro (1963:3 [1945]), é um dos mares mais importantes do globo, estende-se ao longo de 2 505 000 Km2, e “ (…) aparece como um dos traços mais antigos e permanentes da fisionomia do globo (…) com a orientação Leste-Oeste”.

É um mar pouco profundo tendo em média 1500 metros, atinge as profundidades máximas na Bacia de Matapán, a Sudoeste da Península Balcânica, aos 5 121 metros. As suas águas são consideradas quentes, tendo temperaturas entre os 15ºC e os 20ºC. Tem um índice de salinidade próximo dos 4% devido à forte evaporação e ao escasso caudal dos rios que nele desaguam. É, em geral, um mar de costas recortadas como se verifica nos escritos de Ribeiro (1987) e Virgili (2004).







Os rios que desaguam no mar Mediterrâneo são sessenta e nove (69), entre eles, destacam-se pelo elevado caudal e excepcional beleza, os seguintes: Rio Nilo, Rio Tibre, Rio Ebro, Rio Pó e Rio Ródano.

Durante toda a história foi um mar de distinta importância, acentuada nos primórdios (Antiguidade Clássica) onde Gregos, Romanos e Fenícios (ou Cartagineses) o utilizaram para o transporte de mercadorias (comércio), não só pela rapidez de deslocação em relação às restantes formas de transporte, mas também devido aos acentuados recortes da costa e das inúmeras ilhas que facilitavam a criação de portos. As principais ilhas são: Sicília (Itália), Chipre, Córsega (França), Creta (Grécia), Baleares (Espanha), Maiorca (Espanha), Rodes (Grécia), Sardenha (Itália), Ibiza (Espanha), Malta, Elba (Itália).


BIBLIOGRAFIA

RIBEIRO, Orlando (1963 [1945]), Portugal o Mediterrâneo e o Atlântico, 2ª Edição, Editora Livraria Sá da Costa, Lisboa.

RIBEIRO, Orlando (1987), Mediterrâneo: Ambiente e Tradição, 2ª Edição, Editora Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa.

VIRGILI, Carlos (2004), Mediterrania: mar de vida, el litoral espanyol = mediterraneo. ma de vida, el litoral español = mediterranean. sea of life, the spanish coast, 1ª Edição, Editora Lunwerg Editores, S.A., Barcelona.